Os sete pecados sindicais
Os movimentos sociais, no atual momento, carregam duas características conflitantes, mas nem por isso, excludentes. A primeira diz respeito ao campo de atuação, que também remete, de alguma maneira, à identidade. A segunda coloca em questão as suas relações com outros movimentos e com o conjunto da sociedade.
No que diz respeito à atuação, é inegável que vivemos um período de riqueza de possibilidades de comunicação e divulgação de idéias e ações. O Exército Zapatista de Libertação Nacional que o diga, mas também podemos listar uma série de outros movimentos que conseguem visibilidade das suas lutas e dos seus propósitos. No tocante aos sindicatos1, o desenvolvimento das técnicas trouxe elementos novos às relações com as respectivas categorias e novos sentidos às lutas sindicais. Os sindicatos, em função disso, passam a ser mais do que entidade de classe, mas são tensionados a ampliar e aprofundar o discurso, para os campos onde estão inseridas suas categorias. A tensão capital X trabalho está mais viva do que nunca, mas também muito mais complexa.
É aí que entram as relações dos sindicatos com o conjunto da sociedade e com os movimentos. A encruzilhada é clara: fecham-se em questões corporativas (por mais que sejam legítimas) e perdem o poder de agregar e construir alianças, ou ampliam suas preocupações e perdem o sentido das especificidades das categorias que representam?
O desafio que se coloca é o de ler o momento construindo as chaves de leitura no mesmo momento. Esse é um caminho para tentar conviver com as contradições que o mundo capitalista hoje nos empurra.
É nesse impasse que entendo que hoje se encontra o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (SEPE). A fragilidade política e a desconexão com a categoria são sintomas de alguns pecados que sucessivas direções deste sindicato vêm cometendo. Podemos identificar tais pecados:
1- Monólogo. Há anos as direções têm dificuldade em escutar a própria categoria. Escutar, no sentido Paulo Freire dizia2, de ter os ouvidos abertos para ouvir, inclusive, o que não se deseja ouvir.
2- Desconexão. O monólogo produz desconexão e vice-versa. O descolamento da categoria coloca em xeque a própria representatividade, uma vez que a categoria muitas vezes desconfia das propostas da direção.
3- Soberba. Na seqüência da equação, a soberba aparece na pretensão da direção de “conduzir” a categoria. Acaba criando a imagem de uma vanguarda quixotesca, que não consegue agregar nem produzir fatos significantes.
4- Vitimização. O resultado disso é o discurso da vítima permanente, sempre apontando os algozes. Esses podem ser os pais, as comunidades, as direções, as secretárias, as coordenadorias ou qualquer outro que esteja posicionado no campo oposto. A posição de vítima não contribui em nada para a construção de uma história – pelo contrário, debilita, infantiliza, uma vez que se coloca em posição inferiorizada, subalterna.
5- Superficialismo. Nesse quadro, não é possível ter uma proposta consistente, pois a própria identidade fica debilitada. Não há proposta para a categoria, nem para o campo, pois não há espaço, nem tempo, nem energia para essas discussões. Assim, professores deixam de ser intelectuais e se transformam em operários, porém, sem produzir riqueza. As relações com as instituições, por sua vez, se dão de forma rala, pois não há proposta, exceto a questão pontual. Não se discute projeto de educação, mas apenas a aprovação automática ou não, por exemplo.
6- Isolamento. A conseqüência natural desse conjunto é o isolamento. Tudo isso torna complicado produzir alianças eficazes, pois aliados consistentes não embarcam em projetos vagos. Quando há algum embate imediato, o constrangimento impede que se façam alianças mais amplas, pois tudo fica restrito a questões falsamente éticas, quando na verdade são fruto de fragilidades políticas.
7- Miopia política. Trata-se da incapacidade de compreender os acontecimentos na forma que se apresentam, com os personagens e o contexto em que aparecem. Isso impede de ver o que há além das políticas e dos projetos e também obstrui a possibilidade de agir de forma inesperada, criando fatos e desconstruindo discursos. O binarismo e a ortodoxia extrema atrapalham a condução de discussões e congelam debates, criando imagem de incoerência e sectarismo, tão prejudiciais às entidades de classe.
Por essas questões, o SEPE perde chances históricas de agregar, de engrossar a participação de profissionais da educação no nosso estado, em especial no município do Rio de Janeiro. Por exemplo, quando agora a SME3 anuncia preocupação em aumentar do tempo de permanência dos alunos nas escolas, o sindicato perde a oportunidade de questionar o teor desse projeto. Não poderia pressionar para voltar aos seis tempos? Ou será que está tudo bem com 4 horas de aulas regulares por dia? Qual a proposta do sindicato para isso? Repare que isso diz respeito também a especificidades da categoria, pois a mesma SME anuncia possibilidade de ampliar a carga dos professores para o regime de 30h/semana. Está tudo interligado e são questões que mobilizariam a categoria, ainda que aparentemente não esteja com ânimo para fazer protestos nas ruas, ou aderir a greves (parece que essa é a única forma de pressão dos operários-professores). Mas, isso é tarefa das direções sindicais: entender o que a categoria pensa e quer.
Roberto Marques
Excelente texto. Alguém precisava traduzir e pontuar o que toda a categoria sente, mas nem sempre racionaliza.
ResponderExcluirCopiei e estou enviando para toda a minha mala direta. Precisamos espalhar antes que seja retirado do Blog da Regional. Autoritarismo, centralismo e burocrácia, não convivem com democrácia e liberdade.
Gostaria de poder discutir essas idéias com outros professores e com o Roberto. Conheço muitos que pensam da mesma forma. Que tal formar um Grupo de Trabalho para mudar esse Sindicato?
Pela mordaça imposta, por toda lama que escorre, pelo véu que acoberta e sobretudo pelo silêncio da categoria. Parabéns vocês venceram! Os reacionários impediram o novo, mataram a novidade, cancelaram as mudanças. O exercito de Leon, pisoteia as flores e marcha altivo em direção ao abismo.
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