sábado, 5 de setembro de 2009

Palavras do Professor: A ESTRELA (DE)CADENTE DO PT


Por Roberto Mansilla[1]
Surpreende-me que ainda existam pessoas que se surpreendam com o PT. O partido que atuava sob a aura dos “nobres princípios”, da luta pela justiça social, e da defesa intransigente da ética, há muito já não existe, se é que algum dia realmente existiu como tal.
A mudança começou ainda na segunda metade da década de 1990, quando após três derrotas consecutivas na sua pretensão presidencial, Lula e seus comandados abandonaram a sua velha rejeição por alianças amplas e heterogêneas e trocaram a bandeira de um “radicalismo social” por uma indefinida roupagem social democrata. O discurso raivoso contra tudo e contra todos foi abandonado. A permanente mobilização de setores sindicais e movimentos populares também foram substituídos por um comportamento menos agressivo e pelos acordos e conchavos bem a gosto dos partidos tradicionais (burgueses).
Essa mudança já vinha se processando antes mesmo da candidatura de Lula em 2002 e da famosa Carta aos Brasileiros, na qual era exposto o compromisso de manter os contratos internacionais firmados pelos governos anteriores. Com isso, os petistas tentavam afastar quaisquer insinuações de que iriam mergulhar o país numa perigosa aventura política, e tentavam atrair os votos da classe média e de setores do empresariado, o que de fato ocorreu. O sectarismo e o maniqueísmo, marcas registradas do partido de Lula pareciam coisas do passado.
A ascensão ao poder, emoldurada pelo slogan de que “a esperança venceu o medo” sinalizava que havendo tomado juízo o PT poderia liderar um processo de modernização política do país, na qual a consolidação da democracia, a estabilização da economia, a acentuação da justiça social e o aprimoramento da ética nas relações públicas caminhariam juntos. Mas não foi o que se viu.
O que se viu foi o PT apoderar-se dos principais cargos da administração federal e das estatais, e distribuí-los entre correligionários, protegidos e familiares; o que se viu foi governo petista aumentar de forma descomunal os quadros da administração, inflar os gastos públicos, especialmente com propaganda; finalmente, o que se viu foi o governo do PT estabelecer uma maioria no Congresso ao preço da prática do mais explícito e despudorado fisiologismo que se tem notícia.
O coroamento de tais práticas não poderia ser outro que não a descoberta do mais amplo esquema de corrupção da História Republicana conhecidos. Dirigentes partidários, ministros, parlamentares e empresários movimentaram milhões de reais num esforço para manter sólida a aliança que sustentava Lula no poder. A revelação do esquema fez cabeças importantes rolarem e atirou no lixo a boa fama que ainda restava ao partido de Lula.
Numa mistura da esperteza de Lula com a incompetência da oposição burguesa (PSDB, DEM, notórios partidos corruptos), o presidente conseguiu escapar mais ou menos ileso do imbróglio do mensalão. Mas o PT não mais se recuperou do golpe. Perdeu definitivamente a identidade, e principalmente a parcela de influência sobre o governo Lula. Transformou-se, no Congresso e no Executivo, num mero coadjuvante, obediente e submisso, e teve que engolir o crescimento do prestígio do PMDB junto ao presidente.
Despudorado, assumidamente fisiológico e completamente imune a crises de consciência ou de falso moralismo, o PMDB passou a servir melhor aos propósitos pragmáticos de Lula, tanto no que tange à governabilidade quanto no que diz respeito à sucessão presidencial.
A crise no Senado que já vinha se deteriorando, teve seu grand finale no apoio oficial do PT à permanência de José Sarney na presidência da Casa, apesar das várias denúncias contra o coronel maranhense como o favorecimento da empresa do neto na prestação de serviços no Senado, vender terra no nome de laranjas para não pagar impostos, desvio de recursos públicos, prática de nepotismo por atos secretos... De nada adiantou a opinião pública e as manifestações realizadas nas principais capitais brasileira exigindo a renúncia de Sarney. Tudo terminou em uma bela pizza. Com a ajuda imprescindível de três senadores do PT, as acusações que pesavam sobre o coronel e Presidente do Senado, acabaram sumariamente arquivadas.
Essa atitude expôs definitivamente as chagas do partido. Desnorteados, os petistas partiram para o salve-se quem puder. Alguns, como Marina Silva e Flávio Arns, saltaram do barco a tempo de tentarem salvar o seu cacife eleitoral em outros partidos. Outros mergulharam num processo hamletiano, da escolha entre os ditames da consciência ou a submissão vergonhosa de suas consciências aos ditames do chefe. No caso do senador Aloísio Mercadante, prevaleceu a segunda opção.
Será possível o PT juntar seus cacos? Uma coisa é certa. A identidade de um partido baseado na mobilização dos trabalhadores – que desde a década de 1990 foi se perdendo –, tornou-se, com os episódios do socorro a Sarney (e da aproximação com o Collor, lembram dele?) um partido que hoje é uma caricatura de si mesmo: eleitoreiro, clientelista, fisiológico e sem o mínimo de vergonha na cara.

[1] Professor de História da Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro.

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